Lula envia ao Congresso PL Antifacção após operação no Rio

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) enviou ao Congresso Nacional nesta sexta-feira (31) o projeto de lei antifacção que endurece as penas para o crime organizado. Elaborado pelo Ministério da Justiça, o texto foi concluído após a forte repercussão da megaoperação policial contra o Comando Vermelho no Rio de Janeiro.
“Nós vamos mostrar como é que se enfrentam as facções nesse país, o crime organizado e aqueles que vivem da exploração do povo mais humilde”, disse Lula em vídeo publicado nas redes sociais. O petista destacou que o “PL Antifacção” foi encaminhado com pedido de tramitação em urgência.
O ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, afirmou que o projeto é “moderno” e vai combater o “flagelo nacional”, que são as facções criminosas. “É um combate enérgico às facções criminosas, mas é importante dizer que elas serão combatidas dentro do Estado Democrático de Direito”, enfatizou o ministro.
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Em nota, o presidente voltou a dizer que as facções só serão derrotadas com o esforço conjunto de todas as esferas de poder e mandou um recado ao Congresso. “Diferenças políticas não podem ser pretexto para que deixemos de avançar. Por isso, confio no empenho dos parlamentares para a rápida tramitação e aprovação destes nossos projetos. As famílias brasileiras merecem essa dedicação”, afirmou Lula.
Caso o “PL Antifacção” seja protocolado com urgência constitucional, Câmara e Senado terão 45 dias cada para votar a proposta. Se o prazo não for respeitado, a pauta da Casa onde a matéria estiver tramitando ficará trancada.
Lewandowski encaminhou o projeto à Casa Civil na semana passada. Nesta tarde, Lula convocou Lewandowski, o advogado-geral da União, Jorge Messias, e o ministro da Defesa, José Múcio, para fazer os últimos ajustes.
Inicialmente, o projeto era chamado de “antimáfia”, mas o nome foi alterado para “antifacção”. As mudanças acertadas durante a reunião no Palácio do Planalto ainda não foram anunciadas. O texto deve ser publicado em edição extra do Diário Oficial da União (DOU) ainda hoje.
Mais cedo, o senador Sergio Moro (União-PR), que foi ministro da Justiça durante o governo Bolsonaro (PL), criticou o projeto pela criação do novo tipo penal de “organização criminosa qualificada” e pela possibilidade de visita íntima a membros de organizações criminosas.
Para Moro, “seria um desastre” instituir um tipo penal “privilegiado, com pena reduzida”. Além disso, o senador apontou que a visita íntima seria “um retrocesso em relação a já vigente lei dos presídios federais”.
“Lula, depois de falar que o traficante é vítima do usuário, tem que mostrar que está de fato ao lado do cidadão e não do lado dos faccionados. Não cabe enviar ao Congresso um cavalo de Tróia”, disse Moro em referência a declaração de Lula sobre traficantes serem “vítimas” de usuários de droga.
O que determina o texto original do “PL Antifacção”
O texto apresentado pelo Ministério da Justiça, no último dia 22, determina a criação do crime de “organização criminosa qualificada”. A pena prevista é de 8 a 15 anos de prisão. O novo tipo penal é considerado crime hediondo e será aplicado quando a facção controlar territórios ou atividades econômicas por meio de violência ou ameaça.
Hoje, a pena para quem integra, promove ou financia uma organização criminosa é de 3 a 8 anos de prisão. A proposta do governo aumenta a pena para 5 a 10 anos. Para homicídios cometidos a mando de uma organização criminosa qualificada, a pena será de 12 a 30 anos de prisão.
O projeto fixa novas regras para infiltração de policiais nas organizações criminosas, como atuação em sigilo e criação de empresas fictícias. Além disso, estabelece regras para monitoramento das conversas entre presos ligados a facções e seus advogados dentro do sistema prisional.
As autoridades também poderão realizar uma intervenção judicial em empresas utilizadas em esquemas conduzidos pela organização criminosa, com a nomeação de gestor externo. O Ministério da Justiça deve propor a criação de um banco nacional para reunir informações sobre as facções que atuam no país.
Governo descarta classificar facções como terroristas
Nesta quarta-feira (29), Lewandowski reiterou que o governo Lula (PT) não pretende equiparar facções criminosas a organizações terroristas. Ele afirmou que o terrorismo envolve uma percepção subjetiva do tipo penal, enquanto as facções tem finalidade objetiva.
“O terrorismo envolve sempre uma nota ideológica, atuação política e repercussão social. As facções criminosas são constituídas por grupos de pessoas que sistematicamente praticam crimes que estão capitulados na legislação do país. Portanto, é muito fácil de identificar o que é uma facção criminosa pelo resultado de suas ações”, disse o ministro.
Segundo ele, alterar a legislação vigente dificultaria o combate aos criminosos. “Da parte do governo federal, não temos nenhuma intenção de fazer uma mescla desses dois tipos de atuação. Até porque, dificultaria muito o combate desses tipos de criminosos, que são claramente distintos no que diz respeito à sua motivação e atuação”, acrescentou.
Após operação no Rio, combate ao crime organizado antecipa disputa eleitoral
A ação realizada na terça-feira (28) nos complexos da Penha e do Alemão terminou com 113 presos e 121 pessoas mortas, quatro delas eram policiais. A operação gerou uma troca de acusações entre o governador do estado, Cláudio Castro (PL), e o governo Lula. O presidente só se manifestou mais de 24 horas depois da ação policial.
Em nota, o petista adotou tom cauteloso, evitou críticas a Castro e cobrou “trabalho coordenado” contra as facções criminosas. O governador havia reclamado sobre falta de apoio do Executivo federal, mas foi rebatido por Lewandowski.
Os dois se reuniram na quarta (29) e anunciaram a criação de um Escritório Emergencial de Combate ao Crime Organizado para a conter a crise de segurança pública no Rio. Em meio ao embate político, Castro e governadores de direita criaram o “Consórcio da Paz” voltado a cooperação entre os estados para combater o crime organizado.
Além disso, a megaoperação também será avaliada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) após o ministro Alexandre de Moraes assumir a relatoria da ADPF 635, conhecida como “ADPF das Favelas”. Na próxima segunda-feira (3), Moraes vai ao Rio para ouvir as explicações de Castro e dos chefes das polícias sobre a ação.