O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), reforçou e ampliou, nesta semana, as medidas cautelares impostas ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), determinando que o político está proibido de conceder entrevistas que possam ser veiculadas ou retransmitidas por qualquer meio, inclusive por terceiros nas redes sociais. A decisão gerou forte reação no meio jurídico e provocou uma rara divergência pública dentro da Suprema Corte.

No podcast 15 Minutos, da Gazeta do Povo, os jornalistas Rosana Bittencourt e Frederico Junkert analisaram a decisão e destacaram o voto do ministro Luiz Fux, que se manifestou contra a extensão da proibição. Para Fux, a medida representa uma possível violação à cláusula pétrea da Constituição que garante a liberdade de expressão e de imprensa.

“Parte das medidas cautelares impostas, consistente no impedimento prévio e abstrato de utilização dos meios de comunicação, confronta-se com a liberdade de expressão”, declarou Fux em seu voto.

A controvérsia surgiu após a defesa de Bolsonaro anunciar uma entrevista ao portal Metrópoles. A dúvida inicial era se a proibição de usar redes sociais incluiria também entrevistas concedidas a veículos de comunicação. Moraes então emitiu novo despacho, deixando claro que qualquer forma de transmissão ou retransmissão de conteúdo vinculado ao ex-presidente está vetada — inclusive por terceiros — sob risco de prisão por descumprimento.

Segundo Moraes, a proibição busca impedir que Bolsonaro use a mídia para “burlar” as restrições judiciais. “Inclui, obviamente, as transmissões, retransmissões ou veiculação de áudios, vídeos ou transcrições de entrevistas”, diz o texto da decisão.

Fux: Liberdade de expressão sob ameaça

O ministro Fux apresentou voto contrário à decisão, alegando ausência de elementos concretos que justifiquem a gravidade das medidas. Ele argumentou que não há provas de que Bolsonaro esteja tentando fugir do país ou atrapalhar as investigações. Ainda segundo Fux, a decisão pode configurar censura antecipada e inconstitucional.

O magistrado citou precedentes do próprio STF, incluindo decisões do ministro Celso de Mello, para sustentar que o poder cautelar da Justiça não pode se transformar em mecanismo de repressão da liberdade de expressão. Fux ressaltou que o exercício do direito de crítica é essencial ao regime democrático.

“Não cabe ao Estado definir previamente o que pode ou não ser dito por indivíduos ou jornalistas”, apontou Fux, ao lembrar o papel institucional da imprensa.

Comparações com o caso Lula

O caso gerou comparações com episódios de 2018 e 2019, quando o então ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mesmo condenado e preso, concedeu entrevistas autorizadas pelo STF. Entre elas, uma famosa entrevista à Folha de S.Paulo, liberada por Ricardo Lewandowski, que também reconheceu o direito de liberdade de imprensa mesmo para réus e custodiados.

O próprio Lewandowski, hoje ministro da Justiça, argumentou à época que impedir entrevistas de presos equivaleria a censura prévia e violaria princípios constitucionais. Ele citou exemplos de criminosos comuns — como Fernandinho Beira-Mar e Suzane von Richthofen — que também concederam entrevistas à mídia.

“Não é crível que uma entrevista com um ex-presidente ofereça mais risco ao sistema carcerário do que entrevistas com condenados por tráfico ou homicídio”, escreveu Lewandowski em 2018.

Defesa de Bolsonaro: declaração pública, não entrevista

No momento, a defesa de Jair Bolsonaro tem até o fim do prazo fixado por Moraes para explicar se ele violou a cautelar ao fazer uma declaração pública à imprensa após reunião com deputados da oposição na Câmara. Bolsonaro disse:
“Não roubei, não desviei recurso público, não matei ninguém. O que estão fazendo é covardia. Vamos enfrentar tudo e todos.”

Segundo o podcast, a expectativa é que os advogados aleguem que não se tratou de uma entrevista, mas sim de uma fala espontânea captada por jornalistas, o que não violaria tecnicamente a medida. Ainda assim, Moraes poderá interpretar o gesto como tentativa de burlar sua ordem — o que pode resultar em prisão preventiva.

Clima de tensão institucional

A decisão de Moraes, a reação de Fux e a comparação com o caso Lula alimentam o debate sobre os limites da atuação do STF em relação a figuras públicas e a liberdade de expressão. A crescente tensão no Supremo pode sinalizar novos embates institucionais nas próximas semanas.

A Gazeta do Povo continuará acompanhando o caso.

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