Ciro Gomes se reaproxima do PSDB por candidatura em 2026
Em meio ao tirocínio retórico entre a esquerda comandada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o núcleo da direita dos apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) após o anúncio do tarifaço de 50% sobre as exportações brasileiras para os EUA, um nome que andava sumido do debate político nacional reapareceu distribuindo críticas para todos os lados. Isolado pela esquerda e pela direita, Ciro Gomes (PDT) ressurge em busca de espaço para mais uma candidatura presidencial — ou pelo menos ao governo do Ceará, estado que governou entre 1991 e 1994.
A pouco mais de um ano para as eleições 2026, Ciro Gomes está em conversas para um retorno ao PSDB após 28 anos fora da sigla. “Devemos aceitar passivamente a violência econômica imposta a nós pelo estrangeiro? Claro, óbvio que não”, afirma Gomes em vídeo nas redes sociais, no último dia 18.
“Mas daí a celebrar, como Lula está fazendo, os benefícios eleitorais de curto prazo, que vêm da soma da injustiça da medida ianque com a tremenda burrice dos Bolsonaros, pai e filhos, e aliados como, surpreendentemente, até o governador de São Paulo, vai uma enorme e intransponível distância”, ataca o político cearense na postagem, que alcançou grande repercussão.
Oficialmente, Ciro Gomes mantém a posição externada depois do pleito de 2022 de nunca mais disputar eleições. “Alguns amigos muito generosos lembram o meu nome, mas não pretendo mais ser candidato a nada”, reafirmou a jornalistas durante evento político em Fortaleza, no mês de maio. Reservadamente, porém, já admite assumir uma candidatura se uma terceira via se abrir para ele no ano que vem.
Em conversa com a reportagem da Gazeta do Povo, articuladores próximos ao político cearense veem no tarifaço de Donald Trump uma oportunidade para mais uma tentativa de conquistar a Presidência da República como um nome alternativo à polarização entre a esquerda e a direita brasileiras. Com a popularidade de Lula em recuperação — mas ainda baixa — e a de Bolsonaro em queda após o tarifaço, de acordo com pesquisas de opinião divulgadas na última semana, Ciro Gomes teria o perfil ideal para surgir como alternativa, defendem os apoiadores.
Gomes tem bom espaço no PDT, mas a tendência é que a legenda apoie a reeleição de Lula, o que fecharia a possibilidade do cearense ser candidato à Presidência. Em fase de consolidação como legenda nanica após o fracasso do processo de fusão com o Podemos, o PSDB, por sua vez, ganharia um reforço importante para 2026 com o retorno de Ciro Gomes.
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Cúpula tucana investe em atrair Ciro Gomes na tentativa de resgate mútuo
A possibilidade de lançar um candidato competitivo ao governo do Ceará ou mesmo à Presidência da República, hoje inexistente para os tucanos, seria capaz de dar sobrevida ao partido mesmo em caso de derrota — ao puxar nomes para a bancada no Congresso Nacional.
A alta cúpula tucana, composta pelo deputado federal Aécio Neves e o presidente nacional da sigla, Marconi Perillo, assim como Tasso Jereissati, ex-senador e ex-governador por três vezes do Ceará, tenta ativamente concretizar a volta de Ciro. O PDT, no entanto, não dá mostras de ter desistido dele, e tenta mantê-lo.
“O Ciro não sai. Tenho uma relação pessoal, de irmandade, com ele. Jamais ele faria isso comigo”, afirmou Carlos Lupi, presidente nacional da sigla, à Folha de S. Paulo no final de junho. Por trás da disputa, está também o desempenho de Ciro em sondagens recentes.
De acordo com pesquisa de intenção de votos para presidente nas eleições de 2026 divulgada pelo instituto Quaest no último dia 17, Ciro Gomes aparece em terceiro lugar em todos os cenários de primeiro turno testados — o nome dele não aparece nos cenários de segundo turno. A pesquisa Quaest foi encomendada pela Genial Investimentos e realizada entre os dias 10 a 14 de julho. A pesquisa ouviu 2.004 pessoas com 16 anos ou mais, em 120 municípios do país. A margem de erro é de 2 pontos percentuais, para mais ou para menos e o nível de confiança é de 95%.
No Datafolha de maio, no cenário sem Lula e Bolsonaro, Ciro lidera as intenções de voto, à frente de Fernando Haddad (PT) e de Tarcísio de Freitas (Republicanos). Nos cenários com Lula, Ciro aparece em terceiro lugar. Na disputa de 2022, o ex-governador do Ceará acabou a disputa presidencial em quarto lugar, com 3% dos votos válidos. Antes disso, disputou a eleição presidencial outras três vezes: em 1998, 2002 e 2018.
“O retorno de Ciro Gomes ao PSDB está sendo articulado nos bastidores como uma tentativa de resgate mútuo: Ciro busca sobrevida política e o PSDB tenta recuperar alguma relevância nacional”, avalia o cientista político Elias Tavares. “Depois de anos de desgaste e isolamento, Ciro percebeu que já não há espaço para ele na esquerda, dominada por Lula, nem na direita bolsonarista. O centro, embora desidratado, ainda oferece uma avenida para quem conseguir ocupá-la com consistência, e o PSDB, mesmo em ruínas, ainda tem uma marca reconhecível.”
Para o cientista político, é ao mesmo tempo uma cartada arriscada e necessária. “Para o PSDB, pode ser a única chance de sair da irrelevância. Para Ciro, talvez seja o último movimento antes de virar apenas memória de uma terceira via que não aconteceu.”
Na avaliação de Tavares, a perspectiva de uma candidatura presidencial é mais clara do que no plano estadual para o político cearense. “No caso de uma candidatura ao governo do Ceará, o cenário se mostra ainda mais desafiador. Apesar de ser um nome amplamente conhecido no estado, Ciro carrega um desgaste acumulado e enfrenta um teto eleitoral que o limita”, diz o analista político.
“Diferente de outros momentos da sua carreira, hoje ele não é mais visto como unanimidade nem dentro do próprio campo progressista cearense. Isso faz com que, paradoxalmente, seja mais viável para ele buscar espaço na cena nacional, onde ainda desperta curiosidade e pode se apresentar como alternativa, do que insistir em um projeto local, onde o terreno já está saturado e as alianças fragmentadas”, analisa Tavares.